A tecnologia e o uso dos recursos digitais são temas sempre polêmicos e que normalmente vêm acompanhados de dúvidas por parte dos pais, além de um profundo vazio de entendimento quando se trata do olhar de diferentes gerações sobre o tema.

Quando a assunto recai sobre o comprometimento do rendimento escolar em função do uso das mídias sociais (e as necessárias barreiras de acesso a estas tecnologias), o assunto causa mais polêmica ainda. O conhecimento disponível sobre o assunto é iluminado por muitas e diferentes óticas. Em resumo, não há respostas prontas nem modelos universais que sejam adaptáveis a todas as realidades e lares onde esta questão se instalou.

É fato que há uma inquietação e uma busca por respostas ou elementos que possam nortear esta discussão. Em linhas gerais, o tema se aquece na medida em que as gerações se afastam.

Para os mais jovens não há ar fora das redes sociais. Múltiplos são os grupos dos quais fazem parte. Se antes falávamos com uma pessoa, hoje falamos com vários grupos de muitas pessoas, que respondem, criando um enorme burburinho, na maioria das vezes, silencioso. Para ser aceito nos grupos, é necessário que se interaja com os mesmos, exigindo dos adolescentes tempo para teclar com tanta gente…

Para os veteranos, falta ar no reduzido espaço tecnológico.

A dificuldade de entendimento cria muros, não raro, instransponíveis, entre gerações com interesses e verdades tão distintas. Os muros vão, aos poucos, tomando corpo e amplitude.

Os pais reclamam que seus filhos vivem mergulhados em seus celulares e computadores, mas iniciam precocemente os filhos nesta arte, quando querem conversar com calma nos restaurantes e eles lhes incomodam. Ou quando o falatório da longa viagem fica insuportável e os vídeos dão lugar ao encantamento com o percurso e fazem da tela o único e silencioso interesse dos pequenos. Muitas vezes querem pouco trabalho (porque brincar com os filhos dispende tempo, energia e disposição). E é neste momento que o desenho ou o jogo caem sobre as famílias como um bálsamo. Serão eles mesmos que se intensificarão na medida em que os pequenos forem crescendo, apenas mudando o foco de atenção para outros aparatos tecnológicos.

Com base nesta polêmica tão atual, a Sociedade Americana de Pediatria divulgou novas diretrizes para orientar os pais para o uso de equipamentos eletrônicos pelas crianças.

De cara, é preciso dizer que a tecnologia está posta e que não fazemos, aqui, a defesa da saída dela de nossas vidas. Ela também é boa, encurta distâncias, aproxima pessoas, recria contatos, democratiza visões e permite amplidão do alcance das relações sociais, mas merece ser discutida e seu uso ser dimensionada pelas famílias.

Não há fórmula mágica e não há receitas prontas que devam ser aceitas sem a devida crítica. Também vale entender que qualquer medida deve levar em conta contexto e valores de cada família. Logo, seja oriundo de uma renomada instituição, ou vindo da prosa com amigos, fica a premissa de que não é tudo o que cabe a todos em qualquer momento. As orientações abaixo devem ser lidas e adaptadas a cada realidade. E devem, também, ser consideradas com atenção, visto que são fruto de um longo período de estudo para que os parâmetros abaixo fossem publicados.

Vamos a eles:

  • Ate 18 meses, evite usos de mídia eletrônica e chamadas por vídeo;
  • Entre 18 e 24 meses, permita que seu filho acompanhe esporadicamente mídias educativas de qualidade, sempre na companhia dos pais. A ideia é que estes possam saber o que está sendo visto pelas crianças e se o conteúdo dialoga com os princípios, as crenças e o modelo familiar do qual todos compartilham. Na verdade, na busca pelo certo e pelo errado, vale o bom senso, as informações de qualidade e o encaixe destes conteúdos com o jeito de ser de cada família.
  • Entre 2 e 5 anos, permita 1 hora por dia de programas educativos de alta qualidade, ainda acompanhados dos pais, para que possam conversar com seus filhos sobre o que está sendo visto e adequar forma e conteúdo à realidade da família. Interagir com os conteúdos é uma excelente forma de acompanhar e monitorar os interesses dos filhos e traduzir o discurso à realidade da família. Vale lembrar que os pequenos estão em formação e não possuem capacidade de análise crítica sobre a qualidade dos conteúdos e cabe, especialmente às famílias, conduzir este processo.
  • Maiores de 6 anos de idade- A partir desta idade, a Sociedade Americana de Pediatria não define tempo limite, mas aponta que o tempo de permanência na frente das telas não deve se sobrepor ao tempo dedicado às atividades físicas, refeições com a família e tempo dedicado ao sono, este último fundamental para a liberação de hormônio do crescimento e retenção e descarte de informações armazenadas durante o dia, logo, garantindo aquisição de conhecimento. As próprias famílias podem (e devem) definir um tempo limite para o uso das tecnologias eletrônicas.

Por outro lado, como contraponto, trazemos aqui outras contribuições a respeito:

  • A primeira delas ligada à qualidade do relacionamento familiar e a internet: um recente estudo publicado pela revista Archives of Pediatrics & Adolescent Medicine, nos aponta que as habilidades sociais dos adolescentes que permanecem muito tempo à frente da televisão ou no computador ficam prejudicadas. Para que possamos ter uma ideia da dimensão deste distanciamento social, “a Universidade de Otago em Dunedin (Nova Zelândia), avaliou 3.043 adolescentes entre 14 e 15 anos de idade através de um questionário sobre hábitos e relacionamentos e concluiu que, quanto maior o tempo gasto pelo adolescente assistindo televisão ou computador, maior a chance de ter um relacionamento comprometido com os pais. Os pesquisadores puderam estimar que o risco em ter um pobre relacionamento com os pais aumenta 4% a cada hora de TV ao dia e 5% a cada hora de computador”.
  • A segunda delas, um estudo brasileiro que trata sobre a qualidade dos conteúdos utilizados na internet: a Consultoria comScore aponta que 12% dos usuários brasileiros de internet têm entre 6 e 14 anos (cerca de 4,8 milhões de usuários). O principal interesse dos pequenos é por sites de relacionamento e entretenimento (este último utilizando 25% do tempo dispendido), além de cerca de 15% do tempo em redes sociais. Neste caso, toda a atenção é pouca, pois, se por um lado elas acessam os sites para se divertir, por outro lado, também podem estar se relacionando com pessoas mal intencionadas, e isso pode acontecer exatamente quando os pais não se encontram em casa e os filhos podem transitar tranquilamente em diversos sites de entretenimento. Atenção e cuidado, neste caso, são fundamentais.
  • A terceira pesquisa aponta para o rendimento escolar e a relação dele com o uso da internet: segundo a Universidade de Cambridge, crianças e adolescentes que passam a maior parte do seu tempo de lazer na internet, assistindo à televisão ou jogando no computador, tendem a se sair pior nas provas, conforme atestou um estudo com 845 estudantes ingleses entre 14 e 15 anos. Os pesquisadores usaram como base as notas do GCSE (General Certificate of Secondary Education), que no Brasil pode ser comparado com o ENEM. A análise determinou que o tempo médio em frente às telas é de quatro horas por dia. Este mesmo estudo revelou que uma hora a mais em frente à TV ou na internet na idade de 14 anos e meio está ligada a dois pontos a menos em provas na idade de 16 anos (a nota cai de B para D, por exemplo, numa escala de A a E). Também mostrou que os adolescentes que passam uma hora a mais de seu tempo livre fazendo lições de casa ou lendo livros têm as notas mais de quatro pontos maiores que os demais”.

Com todos estes elementos em mãos e muita reflexão a ser feita sobre o tema, ficam, aqui, outros pontos a serem considerados, ainda propostos pela Academia Americana de Pediatria, que:

  • Aponta a importância de que o exemplo venha de dentro de casa. Ou seja, se seu filho não pode ver celular na hora das refeições, cabe aos pais igualmente também não fazê-lo; se os filhos não podem utilizar o celular quando estão em atividade com as famílias, a recíproca também é verdadeira, e assim por diante. Você ainda é o melhor exemplo para seus filhos.
  • A conversa ainda é a melhor estratégia para conscientizar crianças e adolescentes sobre o uso de mídias eletrônicas, como segurança de dados e regras de relacionamento online.
  • Procure definir lugares na casa livres de acesso à internet, como por exemplo áreas de alimentação e quarto, garantindo, assim, os espaços de interação familiar e descanso.

A mesma Academia Americana de Pediatria desenvolveu uma ferramenta que permite aos pais definirem, junto aos filhos, como será a distribuição do tempo dispendido para o uso de mídias eletrônicas. A ideia é cruzar mídias eletrônicas em composição com outras atividades da rotina das crianças e adolescentes, como brincar, dormir, ler, se alimentar e estudar, permitindo que a família crie seu próprio desenho de distribuição do tempo das diversas atividades do dia.

A ferramenta foi traduzida para o espanhol e pode ser acessada aqui.

Fontes: Rádio CBN, Portal Aprender Criança, Revista crescer, Portal QuidNovi e Sociedade Americana de Pediatria