Outro dia falávamos sobre a importância de lidar com as próprias frustrações como oportunidade de crescimento e amadurecimento de nossos filhos. E o quanto os limites claros são fundamentais para que nossos pequenos ganhem autocontrole e autoconfiança.
Há um outro ponto, que decorre naturalmente desta capacidade de ter autocontrole é que ele, o autocontrole, vai muito além de uma aparência serena: implica em ser capaz de manter uma atitude interna de equilíbrio e de prontidão para lidar com situações delicadas de forma lúcida e consciente. Portanto, não basta que nossos pequenos aparentem ter calma. É preciso que esta calma, também, habite em seu interior.
Sabemos da maravilhosa curiosidade, agitação e inquietude natural das crianças, mas isto não exclui, também, o universo rico que eles têm quando entram em contato consigo mesmos. Ou seja: nossos filhos podem ser uma combinação de sons e de silêncios. Múltiplos silêncios: o que decorre da quietude, do encontro com amigos imaginários, do espaço criativo, das memórias, das saudades. Todos são encontros silenciosos.
O que acontece é que nós nos incomodamos com esta quietude. É que ela, muitas vezes, desnuda a nossa incapacidade de silenciar. E vamos nós, munidos de senso adulto, ingressar no espaço sagrado do interior de nossos filhos.
Quem nunca viu uma avó carinhosa que trata logo de propor uma brincadeira porque a criança está muito quietinha? Ou quem nunca propôs um jogo de futebol com os amiguinhos porque a criança está brincando sozinha? Ou mesmo, quem não resiste a um diálogo solitário e trata logo de perguntar: ‘no que você está pensando’?
Claro que inúmeras patologias ou sofrimentos se explicitam no silêncio e precisam ser considerados, mas falamos aqui do salutar momento de introspecção que é interrompido pela nossa própria incapacidade de lidar com este silenciar.
Para concebermos o silêncio de nossos filhos, precisamos fazer uma pausa para revermos nossos próprios encontros conosco mesmos e percebermos que, reiteradas vezes, as crianças que estão brincando tranquilamente sozinhas, são importunadas por nós mesmos, que nos angustiamos com o silêncio e o isolamento de nossos filhos, e entendemos por bem que devemos preencher aquele silêncio, estimulá-los ou mesmo participar daquele momento íntimo em que a criança explora seu universo interior. E então adentramos nesse espaço sagrado com nossas intervenções adultas e ruidosas. Talvez, e só talvez, precisemos revisar nossa capacidade de silêncio interno para permitirmos, com tranquilidade, que nossos filhos fiquem também em silêncio. Não há qualquer problema em incursões solitárias de nossos pequenos. E nem sempre eles precisam de companhia.